terça-feira, 29 de abril de 2014

Até uva-passa (e você também)

Eu tinha lá para os meus 13 anos e estava sofrendo. Todo sofrimento naquela época parecia interminável. Eu me sentia tão adulta em sofrer por amor. E eram 13 milhões de lágrimas que brindavam o fim do meu primeiro namoro. Troquei os beijos pela tristeza e fui sofrer por aí. Então, um dia, entre amigos, eu lembrei dos cachinhos e chorei. E enquanto chorava, aquelas outras crianças-adultas tentavam me dar conselhos e palavras confortáveis de como isso ia passar. Até que uma criança-criança pôde com toda sua juventude e leveza me dizer "tudo passa (pausa), até uva-passa". E eu ri. 

Desde esse dia, a frase "tudo passa" parece-me incompleta e sempre termino na minha cabeça com a imagem do doce sorriso do meu primeiro fim de relacionamento. Eu aprendi que passa mesmo; que um dia toda aquela dor se transforma em lembrança (e, tantas vezes, com sorriso implícito) e deixa de pesar. Todavia, o belo da passagem não é o fim da dor, mas o que acontece depois dela. É o sorriso que vem depois das lágrimas e, ainda, as próximas lágrimas que surgem depois daquelas. É a capacidade de deixar de ser e vir-a-ser.

O que eu não descobri naquela época e que ainda descubro é que tem coisas que não passam. E, as uvas-passa que me perdoem, mas nem tudo é como elas (elas podem se sentir especiais por isso). Nem tudo tem potência de passagem. Há coisas que ficam; mutante-mudando-sendo outras, mas ficam. 

Aquela sensação de sair de uma mesa de bar, onde se estava rodeada por fumantes, chegar em casa com aquele cheiro impregnado nas roupas, no cabelo, na pele; e parece que leva banhos e banhos para livrar-se dele. É que às vezes o cigarro impregna a alma, como o teu impregnou a minha. É que são poucas as coisas que conseguem chegar à esse nível de encontro não-corporal. Essa conversa no silêncio e no toque de mãos-dedos-olhares. O entendimento que não se entende. O que chega n'alma não passa.

Então, talvez, você seja mesmo como uma uva-passa e, assim como os meus 13 anos, passe. Só que tem pedacinhos dessa inteireza que ficarão. É que a minha alma não precisa transformar nada em "ex" para que possa vir-a-ser outra com outros. 

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Pássaro

Você passa assim, de mansinho, como brisa, tentando não se fazer notar. Segue suave nesse ritmo devagar, mas nada-parando, que é para não se apressar e não aparecer demais. É que ventania forte anuncia tempestade e, mesmo os mais distraídos, notam as árvores balançando e as folhas voando pela rua. Ventania dá medo. Sente medo de ser percebido passando e dá falta de desculpas para justificar a passagem. Você só quer ir, sozinho, sem pesar. Sua leveza venta baixinho; seus pés te prendem no instante, no medo, naquela tempestade que ainda não passou. E será que passa?

Você passa. Passa e movimenta. Os olhos fechados e desapercebidos do muito, sentem o carinho que faz seu movimento nas orelhas, pescoço e mãos. Seu sopro é doce e porta sutileza. Mas o movimento por entre os outros parece, por vezes, não combinar com a relação que você traça com o chão. É que vai e fica. E a vontade de ir se cala diante dos pés estagnados e ombros carregados que não se deixam voar.

Voa e vai. 
A chuva já passou e lavou o caminho. 
Deixe que o medo escoe e o corpo se faça outro. 

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