segunda-feira, 29 de outubro de 2012

(des)(re)encontrar(-se)

Se nossas vidas são caminhos, pré-determinados ou não, hei de dizer que existem cruzamentos, esquinas, vias retas e opostas: encontros, reencontros e desencontros.

Vias paralelas podem se cruzar e permitir que algo surja. Não precisamos estar prestando atenção, nem ficar ansiosos, para que o encontro possa ocorrer; deparar-se. O mais belo do encontro é a surpresa de achar aquilo que não se procura.

Olhar nos olhos e encontrar. Através da janela d'alma do outro, perceber-se. Descobrir traços em comum; traços diferentes e complementares; ideias nunca pensadas. Reconhecê-lo e reconhecer-se. 

Vem tempo, vai tempo. Tudo passa, nada muda. Até que, em algum caminho, reencontra-se; encontra-se novamente; torna-se a encontrar. E aquele que parecia não mais existir, aparece como da primeira vez. Há de se perceber a importância do reencontro. Parar de esperar por novos encontros e procurar aquilo que está/já esteve presente.

Fechar os olhos e reencontrar-se. Através do autoconhecimento, resgatar tudo aquilo que parecia esquecido, apesar de parecer importante. Perceber, nas relações, que as semelhanças existem e as diferenças são capazes de construir. Ir de encontro a; procurar por.

Desencontrar. Através da percepção da impossibilidade de desenvolver um (re)encontro, procurar direções opostas. Por ter encontrado-se, impedir o encontro com. 

Olhar em volta e desviar. Seguir caminhos diferentes. Atravessar o cruzamento; não parar na esquina. Desencontrar para poder encontrar. Fugir do encontro marcado, do provável, do caminho acostumado e buscar o inesperado, o súbito, o oculto. Seguir a via de olhos fechados e surpreender-se com o novo.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Ao cara estranho

Caro estranho,

Você não é totalmente estranho, pois sei seu nome, sua profissão, seu time e, até, alguns de seus passos. Só que eu queria saber mais, entende? Eu queria saber qual é a sua cor preferida, seus planos pro futuro, suas ideias mais sem sentido. Adoraria saber se você acorda de mal humor ou não, se você gosta de dormir com os pés para dentro ou pra fora da coberta, se toma café preto ou leite com chocolate. 

Queria saber como foi o seu primeiro dia de aula no maternal, ver as fotos constrangedoras que sua mãe tem para me mostrar. Ouvir suas histórias de criança, de adolescência e compartilhar histórias da sua vida adulta. Você prefere viajar para um lugar de praia ou para o friozinho da montanha? O que é que você pensa sobre a pena de morte? E sobre a legalização do aborto? Posso provar o gosto do seu beijo?

Eu queria te contar as minhas histórias mais sem pé nem cabeça. Também queria te mostrar que, apesar de você só conhecer meu lado bobo, parte de mim tem boas ideias, pensamentos criativos e inteligentes. Gostaria de dividir com você os meus planos pro futuro e te mostrar, na prática, que eu acordo de mal humor.

Se eu pudesse, eu te mostraria o meu melhor lado. Você poderia conhecer minhas melhores características e relevar os muitos defeitos. Se eu não fosse tão atrapalhada com as palavras, se não ficasse tão nervosa diante da sua presença, se eu não me sentisse tão boba em te mostrar o que penso... você leria essa carta.

Por enquanto, conto com a minha imaginação para conhecer você melhor. Quem sabe um dia você não percebe que por trás de todas essas brincadeiras vazias, desse meu jeito superficial e desse desprezo aparente, eu sinto falta de saber quem você é. Até lá, permanecemos assim: estranhos.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Muito pouco

Gritos, exaltação, lágrimas, sexo. Lembra como costumávamos brigar? Éramos capazes das palavras mais agressivas, das lágrimas mais profundas e do sexo mais selvagem. Éramos dois, tentando ir à algum lugar, ou à lugar algum. Mas éramos dois. Intensidade, essa era a palavra. Todos os nossos adjetivos vinham acompanhados do "muito". Nos queríamos demais.

O meu peito se tornou um lugar pequeno. Não havia mais espaço para tudo que eu sentia. Eu queria que fossemos perfeitos e que fossemos para sempre. Demorou para perceber que perfeição e eternidade só existem em um plano ideal. Eu tentava te moldar, você tentava me mudar. E ninguém sabia lidar com toda aquela intensidade.

Ai um dia as lágrimas diminuíram, os gritos abaixaram, as brigas tornaram-se escassas. O muito virou pouco e ficou raro. Toda crítica começou a vir acompanhada de uma promessa de mudança. Toda reclamação passou a trazer um pedido de desculpas. Nos harmonizamos? Há quem pense que sim. Eu acho que nos acostumamos.

Naquele momento em que percebemos que o pra sempre acaba e que a perfeição é imperfeita, paramos de esperar. Resolvemos aceitar as coisas como elas eram. E a exaltação virou calmaria. E o futuro virou o presente. Tudo igual.

Bonito seria se disséssemos que resolvemos aceitar o outro como ele é e que felizes passamos a ser. Porém eu sei e você também, que antes de dormir, depois de um sexo cansado e a luz apagada, pensávamos como queríamos que tudo fosse diferente. E engana-se quem pensa que isso trazia sofrimento. Estava tudo bem.

Ainda haveria salvação? Para nós não, devo dizer. Nos acostumamos demais para viver uma paixão. Cansamos demais para sofrer. E o único muito que nos restou, complementava o pouco. Não há culpados, porém. Não conseguimos culpar nem a um, nem ao outro e nem a si: assim acabaram as acusações. 

O que nos mantinha juntos era a foto no porta-retrato, a música que tocava, as marcas dos objetos nas paredes, a poltrona que quebramos... as lembranças do que costumávamos a ser. Um dia você resolveu ir embora. E por mais que nós dois soubéssemos que era melhor assim, nunca poderei esquecer da dor e do sentimento de impotência quando você apareceu de malas prontas e notícia dada.

Gritos, exaltação, lágrimas, sexo. Foi só quando você abandonou o barco que nós dois pudemos sentir o último suspiro daquilo que chamávamos amor. O peito tornou-se pequeno novamente e o pouco virou muito. E restou saudade. Muita saudade... de um tempo que não volta mais; de um mundo que era só nosso; do muito pouco que restou.

sábado, 13 de outubro de 2012

Uma forma de amar

Eu saí correndo. Não me preocupei em recolher os objetos e nem em dar satisfações. Eu corri para bem longe. Não sabia para onde ia, só sabia que precisava fugir. Não olhei para trás nenhuma vez, eu juro. Não podia voltar, nem se eu quisesse.

Disseram-me que eu fiz um estrago. Chegaram a me falar que você estava sangrando e que não sabiam se iria se recuperar. Eu não quis conferir. Voltar e ver todas as feridas que causei, acabaria comigo. Você acreditaria se eu dissesse que fiz isso por amor?

Há pouco tempo atrás recebi notícias suas. Ouvi falar que você estava bem. Parece que você sumiu com todos os objetos e inventou motivos para entender o que eu fiz. Algumas pessoas ajudaram a limpar toda a bagunça que deixei e você se recompôs. 

Por que é que depois de tanto tempo eu ainda me importo? Eu fugi para bem longe achando que deixaria tudo para trás. Deveria ter escutado minha mãe que dizia "não adianta fugir, seus problemas sempre vão com você". Será que fui covarde?

Já pensei diversas vezes em aparecer na porta da sua casa para te pedir desculpas. Será que você me perdoaria? Eu tenho receio de que você bata a porta na minha cara... eu bateria. Acho que o verdadeiro perdão que eu preciso vem de mim mesmo.

Eu tinha que partir, tente entender. Quanto mais o tempo passava, mais eu percebia o buraco sem fundo que nós estávamos nos metendo. Tentei sair antes que não fosse mais possível. Eu senti dor. Não ache, por favor, que só você sangrou. A tristeza dominou cada pedaço do meu corpo.

Olha pra hoje. Não foi melhor assim? Há vezes em que desistir é a melhor maneira de tentar outra vez. E sim, pode acreditar, tudo que fiz foi por amor. Amor próprio. Amor perdido e, há tempo, recuperado.

sábado, 6 de outubro de 2012

Desacostumar-se

"Tenho medo", ele disse. E saiu andando e esforçando-se para não olhar para trás. Desceu a rua, virou à direita. Caminhou em direção a praia. Parou por segundos e olhou o mar de longe. Viu a linda lua que refletia nas calmas águas do oceano. Conteve na garganta a dor que queria se esvair pelos olhos. Respirou fundo e não seguiu em frente. Virou à esquerda e entrou em casa.

"Tenho medo", ela ouviu. E ficou paralisada enquanto via ele caminhar sem olhar para trás. Quando ele virou à direita, ela chorou. Quis gritar, se conteve. Sentou no meio fio e expurgou toda a dor que sentia pelos olhos. Levantou-se e resolveu não seguir o seu caminho acostumado. Tirou mais do que segundos para olhar a lua que refletia no mar. 

"Tenho medo", ela pensou. Olhou a imensidão que é o mundo e sentiu-se sozinha. Queria jogar-se nas ondas e inteirar-se ao mar. Queria sentir-se maior do que o medo que instalava-se em seu peito. Queria libertar-se de seus sentimentos com a esperança de que, assim, pudesse não mais chorar. 

Ele abriu a porta de casa e olhou ao seu redor. Era hora de fazer as malas e partir. Enquanto resolvia suas questões práticas e empacotava suas roupas, sentia seu coração gritar e implorar para que o medo fosse embora. Olhou uma foto dela e sentiu-se sozinho. Respirou fundo. Queria aprisionar-se em seus sentimentos com a esperança de que, assim, pudesse ficar.

A lua iluminava as águas e a chamava para um mergulho. Tirou suas sandálias e andou em direção aquilo que desejava como seu destino; em direção ao mar; em direção única: para frente. Mergulhou, mesmo com frio, sem olhar para trás.

Ele olhou da janela e viu, mais uma vez, a lua. Sentiu novamente um nó na garganta e as lágrimas que lhe imploravam liberdade. Abriu a porta, desceu as escadas, virou a direita e seguiu em frente. Enfiou os pés na areia e sentiu os milhares de grãos tocando sua pele. Sentiu vontade de tornar-se um grão e unir-se aos outros. Deitou e fechou os olhos.

Gotas salgadas escorriam de seus olhos. Gotas salgadas pingavam em sua pele. Abraçou aquele corpo e esqueceu-se do medo. Um beijo uniu lágrimas e água do mar; homem e mulher; medo e coragem. Levantaram juntos, deram as mãos, viraram de costas para o mar e seguiram para trás. 

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