terça-feira, 7 de agosto de 2012

A espera de uma espera


Sabe aquela história de que quando a gente menos espera as coisas acontecem? Se é verdade ou não, eu não sei. O fato é que eu não estava esperando, quando aconteceu. De longe eu podia ver aqueles olhos me fitando, sentir aquele perfume de insegurança, saborear o gosto da incerteza. Então, eu pude perceber que algo iria acontecer.

Ela caminhou em minha direção e me disse com sua voz suave "oi". Logo já sabia o que ela estava realmente me dizendo: "eu vou entrar na sua vida agora, sem te pedir permissão, mudar seus planos, te fazer repensar suas prioridades e, talvez, partir". Então, respondi "oi", como quem diz, "acho que não tenho nenhuma outra opção, a porta está fechada, espero que você tenha as chaves".

O fato é que a porta estava realmente trancada. Acho que a última vez que abriram, levaram as chaves. Também fizeram questão de trancar todas as janelas e fazer certeza que ninguém mais entraria ali. Eu queria que alguém viesse, e, com chaves mágicas abrisse tudo e me invadisse. Invadisse até que eu estivesse destrancado novamente.

Por diversas vezes quis perguntá-la se possuía as chaves. Tinha medo. Se ela não as possuísse, eu estaria preso no meu isolamento para todo o sempre. Eu queria que ela tivesse as chaves. Queria que ela abrisse as portas e fizesse do meu peito o seu lar. Mas tinha medo.

Percebi, então, que quem havia trancado todas as possíveis entradas, havia sido eu - por medo. Medo de que alguém entrasse novamente e destruísse os móveis, levasse as jóias, quebrasse as louças. Tudo que existia ali dentro era frágil. Queria pegar aquelas faixas de mudança que dizem "cuidado, frágil" e envolver-me nela dos pés à cabeça. Assim, aqueles que me vissem de longe, saberiam que sou facilmente destrutível. 

Não achei esta faixa em lugar algum, sendo assim, tranquei-me em mim mesmo. Ergui minha barreira. "Nunca mais sofrerei de novo", eu pensava. Eu estava protegido, porque tinha medo. Mas aquela moça... olhos cor de mel, cabelos castanhos, olhar fixo... eu queria que ela possuísse as chaves.

Um tempo se passou e eu continuava esperando. Esperando que ela chegasse em casa um dia e me dissesse "amor, o chaveiro da esquina me entregou umas chaves, mas não sei para que servem". Então, eu revelaria para ela: "elas servem para que você entre, para que você faça parte, para que você me inteire". Entretanto, cada dia que passava, mais certeza eu tinha de que as chaves estavam perdidas, que não existia saída pra mim.

Um dia resolvi procurar. Revirei todos os meus cantos. Queria encontrar a passagem para a minha liberdade. Livrar-me de mim. Fugir comigo mesmo para bem longe. Derrubar aquele muro que eu mesmo construí. E quanto mais eu procurava, mais perdido eu ficava. "Quando a gente menos espera, as coisas acontecem..."

Naquela noite, depois do jantar, ela me disse que estava indo embora. Mostrou-me as malas prontas. Eu não conseguia compreender o porque; "Não posso ficar aqui para sempre, esperando que você pare de esperar". Então, eu pude entender. As chaves sempre estiveram na porta. Ela abriu, entrou, acomodou-se, fez uma faxina, organizou os móveis... aí foi embora. Foi embora porque não fui capaz de olhar pra mim. Não fui capaz de olhar pra dentro e perceber que já estava na hora de parar de esperar...

Entendi que não havia nada que eu pudesse fazer para que ela resolvesse ficar na nossa casa. Então, ela me olhou fixamente, me abraçou, pegou minhas mãos e depositou seu chaveiro. "Acho que eu não preciso mais das chaves da sua casa... adeus". E saiu porta afora, deixando as chaves em minhas mãos.



9 comentários:

Camilla disse...

Amor, eu não fui embora, não!!

Marianne disse...

É inevitável a gente sofrer em qualquer relacionamento, mesmo se ele for bom, sempre tem o lado ruim. Já passei pelo mesmo de me isolar no meu mundo achando que ficaria bem comigo mesma, mas sou carente e ao invés de'u dar as chaves, minha porta foi arrombada. Preciso trocar a fechadura logo logo, dammit.

Paula disse...

Pra vc que AMA Ana Carolina... esse conto me fez lembrar de uma musica: "Eu tranco a porta... pra todas as mentiras... e a verdade tbm está lá fora, agora a porta está trancada..." HAUAHAUHAUHA. Muito maneiro o conto! :)

Marcelo disse...

sensacional o conto!
sério mesmo, emocionante!
tenho que achar a chave daqui de casa também ahaha mas sei que elas virão com o tempo

Marina disse...

Muito bom le! Curti a visao!

Nathalia Guerardt disse...

Rindo muito do comentário da Camilla hahahaha

Eu tenho uma péssima mania de trancar a casa e esconder as chaves rs Mas às vezes eu me permito colocá-las na fechadura e as deixo penduradas com a expectativa de que alguém ache e abra propositalmente. Vale a pena correr riscos mesmo você sabendo que podem entrar e levar tudo... o que há dentro perde o valor se não puder ser roubado ;)

Ricardo disse...

Boa lele!!!
achei muito bonito!!!

João Brandão disse...

Nunca diga nunca! Sabe que eu não tenho muito saco pra ler contos e coisas do tipo, maas como voce me perturbou muito, eu li e até que gostei!

Rafaela disse...

NENEM LINDA <3

me amarrei nesse texto disparado, lindolindolindo =)

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